quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

As sementes de Doroti Mueller Schwade



03 de dezembro de 2010

A indigenista, agroecologista e militante socioambiental Doroti Alice Mueler Schwade com sua sensibilidade e determinação é uma das grandes protagonistas de conhecimento para a sustentabilidade da Amazonia. ¨A índia-branca¨ Doroti, nasceu em Blumenau, SC, e veio para Amazônia nos anos 60, ainda muito jovem, pronta para lutar em defesa dos povos indígenas. Nesta luta social pela vida, cultura e autodeterminação, a jovem indigenista conheceu o militante social e religioso Egideo Schwade, com quem veio a se casar, e juntos plantaram alternativas para a soberania dos povos e para o respeito a todas as formas de vida da sociobiodiversidade Amazônica.
As sementes de amor e de sustentabilidade plantadas por Doroti Schwade não são contaminadas com agrotóxicos, herbicidas, inseticidas, não são transgênicas e nem precisam ser semeadas com adubos químicos. As sementes de Doroti valorizam a vida, a soberania, a organização dos povos, a força das mulheres e são regadas com a integração da sabedoria tradicional e popular e do conhecimento cientifico e muito amor.

Doroti transita com completo domínio entre o saber científico e o popular, sabe fazer uma inteligente sinergia entre a ciência libertadora e as práticas tradicionais dos povos da Amazônia. É uma incansável educadora e construtora participativa de conhecimentos para a sustentabilidade das comunidades locais.

Doroti é uma grande experimentadora agroecóloga e compartilha seus conhecimentos com as comunidades amazônidas, os movimentos sociais e com os órgãos de pesquisa, extensão e ensino que buscam a sustentabilidade. Sua filosofia de uso dos recursos naturais, de organização comunitária, de economia solidária e suas práticas agroflorestais, em especial, a criação de abelhas nativas no sítio da família Schwade-Mueller, em Presidente Figueiredo (AM) são temas prioritários dos cursos relacionados à sustentabilidade rural. Dotori contribui com a construção de uma ciência libertadora compartilhando incansavelmente seus conhecimentos e práticas com grupos da EMBRAPA, do INPA, da UFAM, da UEA e do IFAM.
Doroti nos ensina que a agricultura deve produzir vida, e não a morte dos igarapés, a infertilidade do solo, o desmatamento das florestas, a perda do conhecimento tradicional e alimentos que degradam a saúde humana. Ensina-nos também que a verdadeira economia solidária começa com a mesa farta, diversa e saudável não só de nossas famílias, mas também de nossos vizinhos. Doroti nos alerta que povos soberanos se alimentam de seus produtos regionais e naturais, realizam agricultura sem dependência de agrotóxicos e adubos químicos, usam sementes que não perderam a capacidade de se multiplicar anualmente para enriquecer a indústria agroquímica e integram conhecimentos científicos e tradicionais em prol da qualidade de vida.

A "india branca" Doroti demonstra que apesar de sua dedicada militância e magistério em prol de um mundo melhor, a principal função social que homens e mulheres podem desempenhar para este fim é formar crianças éticas, humanitárias que valorizem a diversidade social e todas as formas de vida. Doroti e o ¨guerreiro branco¨ Egideo Schwade constituíram uma família com cinco maravilhosos filhos, todos cidadãos que sabem amar e respeitar e que constituem um exemplo para a transformação social e para a qualidade de vida de sua comunidade e da Amazônia.

Hoje, três de novembro de 2010, membros dos movimentos socioambientais, indígenas, feministas, agroecologistas, das pastorais sociais, os que constroem uma ciência libertadora e todos amazônidas éticos estão de luto pela passagem de Doroti Mueller Schwade, vítima de um acidente vascular cerebral. No entanto, temos muito a saudar e a agradecer pelo exemplo de vida e pela constante luta de Doroti em prol de um mundo justo, sem violência e que respeite todas as formas de vida.

As homenagens estão sendo realizadas na Casa da Cultura do Urubuí, espaço democrático constituído pela família Schwade-Mueller para construção coletiva de conhecimentos para a soberania e sustentabilidade dos povos, em Presidente Figueiredo, município Amazonense que Doroti e Egideo escolheram para colocar em prática e compartilhar com as comunidades locais e militantes de todo o mundo suas filosofias de vida.
Os Waimiri-Atroaris, com os quais Doroti viveu parte de sua vida, e os demais povos da Amazônia perderam hoje uma grande aliada da luta pela soberania e contra os impactos de obras faraônicas como a BR 174, BR 319, a hidrelétrica de Balbina, as hidrelétricas do Madeira e as do Xingu.

Consola-nos saber que entre as mais belas sementes de Doroti continua frutificando entre nós sua maravilhosa família cujos filhos, Adu, Ajuri, Maiká, Maiá, Luiz e o queridíssimo companheiro Egideo Schwade continuarão exercendo dignamente suas cidadanias e nos mostrando que uma outra Amazônia é possível.

(*) Bióloga, Pesquisadora da Embrapa Amazônia Ocidental e militante do Movimento Socioambiental na Amazônia.
 (*) Antropólogo, Prof. Da UFAM, coordenador do NCPAM e militante do Movimento Socioambiental na Amazônia.

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